De olho nos morcegos

Laboratório do Instituto de Biologia da Universidade Rural pesquisa comportamento de morcegos no Rio de Janeiro e Minas Gerais

Victor Sena

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Imagine a cena: cinco ou quatro pesquisadores, no meio do mato, estendendo redes de nove metros de comprimento nas árvores, ao pôr-do-sol. É desta maneira que os membros do Laboratório de Diversidade de Morcegos da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ) capturam as espécies para verificar como é a população desses animais. O Laboratório, coordenado pelo professor Carlos Esberárd, retira amostras de oito locais diferentes por ano. No ano passado, um dos pontos foi o Vale do Rio Sahy, em Mangaratiba (RJ). Para saber o número de espécies que ocorrem ali, os pesquisadores precisam recolher mil indivíduos. Na  XXIV Jornada de Iniciação Científica da Universidade Rural, o grupo apresentou os resultados de suas rondas de 12 horas em volta das redes: 28 espécies de morcegos são encontradas no Vale.

No fim do dia, os grupos começam a armar as redes. Geralmente, são instaladas perto de espelhos d’água e bloqueando trilhas, por onde os morcegos costumam passar. Uma das bolsistas do Laboratório, Bruna Xavier, estudante de Biologia na UFRJ, 7º período, costuma ir a campo. Com os colegas, colocam as redes em duas horas. “Quando começa a anoitecer, a gente inicia a ronda. Se tem três pessoas, cada um fica responsável por quatro horas de ronda. De 15 em 15 minutos, a pessoa vai para rede, coleta e depois volta. Colocamos os morcegos em saquinhos de pano, com as mãos protegidas por luvas grossas. Tem noites que caem mais de 100 bichos”, relata a estudante.

Os animais são retirados da rede assim que ficam presos. Começa, então, o processo de triagem. Medem o antebraço, pesam, identificam as espécies, retiram os parasitas. Os ácaros, carrapatos e pequenas moscas dos morcegos também são objetos de estudo do laboratório. São as pesquisas relacionadas aos hectoparasitas. Com a coleta, é possível encontrar informações para pesquisas diferentes. O Laboratório, além de estudar a riqueza de espécies do local e os parasitas dos animais, também tem pesquisas sobre a reprodução, atividade, diversidade.

“A área em que eu queria trabalhar era a ecologia. No projeto, estudamos a relação do morcego com o ambiente”,  disse Bruna Xavier, que pesquisa a variação das espécies ao longo das altitudes. “Estou pegando uma faixa do Rio para Minas. Vamos subindo e coletando. Há outros projetos também relacionados a altitude. Dá para verificar várias coisas: a variação do parasitismo, como é a atividade deles.”

Segundo o professor Esberard, a conclusão sobre essa variação de altitude que Bruna estuda é a seguinte: a cada 400 metros, é “perdida” uma espécie. “A serra, por ser mais fria, com ambiente mais limitante, é mais difícil para as espécies. No nível do mar, identificamos 28 espécies, 22 a mil metros e 17 espécies a 1500 metros”, explica o pesquisador.

O laboratório instala redes em cinco pontos com variações de altitude: do Vale do Sahy até Aiuroca (MG), passando por Itatiaia (RJ). “A gente marca o bicho quando solta. Então, temos recapturado animais em pontos diferentes daquele em que foi capturado. Eles vão do litoral até a serra, migram para a serra no inverno e voltam para o litoral no verão, como a gente faz”, disse, com bom humor, o professor Esberárd.

Espécies raras –  No Vale do Sahy, espécies raras foram coletadas. O Macrophylum macrophylum só existe em quatro localidades no Rio de Janeiro. A espécie Thyropthera tricolor, que tem ventosas nos dedos e mora dentro de bananeiras, é difícil de capturar, porque tem um sonar bom o suficiente para não perceber a rede.

O Laboratório também já descreveu espécies desconhecidas. Em 2013, uma delas recebeu o sobrenome do ex-reitor Adriano Lúcio Peracchi, que também trabalha com morcegos. A espécie se chama Lanchopylla peracchii. A espécie se alimenta de néctar e ocorre no sul de São Paulo, em todo o estado do Rio e no sul do Espírito Santo.

“Depois de uma amostra boa, comparamos com outras espécies e vimos que ela era diferente. A experiência diz tudo. Quando ficamos em dúvida, a gente traz para ser identificado aqui. Aí, ele começa a fazer parte da coleção de morcegos. Olhamos o tamanho, cor do pele, orelha. Aí, rapidamente chegamos ao gênero, depois a espécie. Normalmente, um ou dois de cada espécie são sacrificados no local para fazer parte da coleção”,  explica o professor Esberárd.

Além dos pontos em continentes, o Laboratório também pesquisa a riqueza de espécies em ilhas. Como elas têm uma área menor e são isoladas, os pesquisadores esperavam menos espécies do que foi encontrado. “Vimos que não é assim. É a história da ilha que determina quantas espécies ela terá. Na Ilha da Gipóia, em Angra dos Reis, esperávamos no máximo 20 espécies. Ela tem 33”,  disse o professor.  “Em vários locais com degradação ambiental, percebemos um número de espécies menor. Em Valença, está abaixo do que esperávamos. É uma mata de apenas 600 hectares, cercada de muito pasto”.

No câmpus Seropédica da Universidade Rural, os pesquisadores também colocam redes. A região de Itaguaí e Seropédica são um dos cinco pontos do estado. Já foram identificados 35 espécies na região. Por ter pouca mata atlântica preservada, há mais morcegos insetívoros do que frutívoros voando pela Universidade.